Início Nuno Reis Reflexões

em busca da espiral perdida

 

Por vezes fica-se com a sensação que algumas pessoas preferem ver o país mal do que ver as próprias teses desmentidas pela realidade. Só assim se pode compreender que tanto se afadiguem em desvalorizar sinais positivos que, a pouco e pouco, se vão confirmando sobre a economia nacional.


 

O incómodo chega ao ponto, imagine-se, de agora até questionarem a credibilidade do próprio Banco de Portugal. Instituição que, diga-se o que se disser, a nível técnico sempre se pautou por independência nas suas análises e estudos. A mensagem não agrada, ataque-se o mensageiro!

 

Não consta que esses pretensos ideólogos do regime ou paladinos do socratismo perdido tenham dito alguma coisa ou reclamado o que quer que fosse quando, sob a liderança de Vitor Constâncio, por passividade ou qualquer outra razão, se tenha desvalorizado os sinais que o BPN ia dando quanto ao que se veio a revelar ser um verdadeiro caso de polícia. Mas já quando a instituição, no âmbito do que é a sua actividade de rotina de análise macroenómica actual e prospectiva emite previsões que não agradam, então, aí sim, inaugura-se nova praxis política.


 

Mas, a pouco e pouco, de forma cabisbaixa mas não envergonhada, a tese da espiral recessiva vai sendo esquecida por aqueles que, de há um ano até há bem pouco tempo, a foram cuidando como diligentes progenitores.

 

Tenho dúvidas que essa forma de fazer política contribua para a credibilidade dos agentes políticos mas continuando a ser Sócrates o pai espiritual de muitos, não espanta a deriva a que o PS vai chegando.


 

De qualquer das formas a realidade vai desmentindo as aves mais agoirentas.


 

Por prudência e pragmatismo chegamos a escrever que 2013 poderia ser um ano bem mais difícil do que o que se está a verificar.

 

Que Portugal tenha registado dois trimestres consecutivos de crescimento de emprego, algo que já se não verificava desde 2008, há 5 anos, é significativo.


 

Assim como é significativo em termos de realidade comparada perceber que no último trimestre Portugal foi de entre os 28 países da União, o que registou maior crescimento de emprego. Dirão alguns que a base é baixa. Talvez, mas também é importante que se reconheça que para sair de um "buraco" é sempre preciso parar de "cavar".


 

Também a nível da produção industrial os sinais começam a ser positivos. Depois de já ter registado um crescimento homólogo em Setembro, em Outubro o índice de produção industrial cresceu  para +3% em comparação com Outubro de 2012, um valor acima da média da UE que se ficou pelos +0,8%.


 

Perceber que no ano passado, por esta altura, se criava uma nova empresa por cada duas que encerravam portas e que hoje, precisamente, há duas novas empresas a nascer por cada uma que não se aguenta, é um sinal revelador.


 

Como é revelador, diria mais inspirador, que o crescimento das exportações nacionais em 2012 e 2013 se tenha explicado, em 70%, por vendas a países fora da União Europeia, mercados que não eram tradicionalmente os de eleição das empresas portuguesas. As empresas portuguesas conquistam quotas de mercado em sectores que, ao contrário do que afirmam os tais paladinos da espiral recessiva, não se confinam ao petróleo e derivados ou à refinaria de Sines: madeira e derivados, papel, pedras preciosas, borracha e derivados, mobiliário, são os sectores que mais quota de mercado internacional conquistaram por parte de empresas portuguesas. Significativo e não de desvalorizar, até porque a perspectiva é que as exportações continuem a crescer nos próximos tempos.


 

Mas a "maçada" que estes sinais parecem representar para os defensores da espiral recessiva não se fica por aqui. A OCDE, o Banco de Portugal, o Credit Suisse, em vários estudos perspectivam um melhor comportamento da nossa economia quer em 2013 quer no horizonte 2014-2015 por comparação com as próprias previsões do Governo.


 

Manda, de novo, a prudência que não se embandeire em arco com estes dados. Mas, que diabo, que se diga de uma vez por todas que é preferível comentá-los do que a outros que pudessem efectivamente confirmar a tal espiral recessiva!


Até porque isso significaria mais pessoas no desemprego, mais empresas a fechar, piores perspectivas futuras, crescimento da emigração. Que a realidade desminta os ideólogos do socratismo é um preço bem mais simpático a pagar! Por muito que lhes afecte o ego ou que o Banco de Portugal seja atacado pela perda de algumas estribeiras.

 

uma questão de saúde

 

O mais recente Relatório de Acesso ao Serviço Nacional de Saúde, feito a partir da compilação de dados financeiros e de produção das instituições de Saúde, evidencia resultados que, para alguns, serão surpreendentes. Mau grado os profetas da desgraça, o Serviço Nacional de Saúde conseguiu manter em 2012, ou até mesmo, nalguns casos, melhorar, alguns dos seus indicadores mais importantes.

 

Comparando com 2011, o número de utentes isentos do pagamento de taxas moderadoras aumentou um milhão, o número de utentes com médico de família cresceu mais de 6%, o número de utilizadores de consultas médicas no âmbito dos cuidados de saúde primários aumentou 4,6%, o número de cirurgias subiu 6%, o tempo médio de resposta aos pedidos de consulta hospitalar diminuiu, o número de camas contratadas em funcionamento na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados cresceu 6%, entre outros exemplos que se poderiam oferecer.

 

A este respeito, aliás, não pode deixar de se notar que os dados factuais compulsados a partir da produção oficial dos hospitais do SNS, desmentem categoricamente o alarme social que alguns parecem ter pretendido gerar com a divulgação, em documentos pretensamente científicos, da insinuação de que haveria uma preocupante redução de cirurgias no SNS nesse ano de 2012.

 

Com efeito, no Relatório Primavera 2012, do Observatório Português dos Sistemas de Saúde, não se hesitou em asseverar a existência de “Alguns sinais que indiciam redução do número de cirurgias (…) em diversos hospitais”, quando, na verdade, a realidade era exatamente a oposta.

 

Neste sentido, sendo bem-vindos todos os contributos, importa que os agentes políticos e os demais atores e interessados no sistema de saúde português, procurem pautar o seu comportamento exclusivamente pelo interesse geral e não deixar-se conduzir por sinais ou indícios que, quase parece por vezes, servem apenas de ilustração a teses previamente construídas.

 

É também de ter presente que a evolução dos resultados relativos aos atos clínicos praticados no âmbito do SNS no ano passado, foram alcançados num quadro em que, simultaneamente, a dívida do SNS sofreu uma significativa diminuição, designadamente por via do pagamento de mais de 1.500 milhões de Euros de dívidas a fornecedores que, cumpre lembrar, os anteriores governos deixaram acumular.

 

Assim, a Execução Económico-Financeira do SNS, na ótica das contas nacionais, registou em 2012 uma receita total de 10.090 milhões de Euros, face a uma despesa total no mesmo período de 8.158 milhões de Euros, daí resultando um saldo positivo no valor de 1.932 milhões de Euros. Esse saldo correspondeu ao montante financeiro destinado ao já referido Programa de Regularização de Dívidas do SNS.

 

Dito isto, e se quisermos ir mais além no tempo, é mesmo de ter presente que, apesar de se tratar de dados já relativos ao corrente ano, segundo a Execução Financeira Avançada do SNS, de Junho passado, da responsabilidade da Administração Central do Sistema de Saúde, I.P., “A informação avançada da execução financeira do Serviço Nacional de Saúde (SNS), apresenta em junho de 2013 um saldo positivo de 74,8 M.€”, já que até essa data no corrente ano a receita cobrada acumulada totalizou 3.874,6 M.€, registando a despesa no mesmo período 3.799,8 M.€.

 

Esta realidade, conjugada com a aludida produção clínica do SNS, desmente cabalmente os vaticínios que alguns profetas da desgraça nos últimos dois anos têm vindo a fazer sobre o sector da Saúde.

 

Assim, na audição parlamentar do Senhor Ministro da Saúde, ocorrida a 15 de novembro de 2011, por ocasião da apreciação na especialidade do Orçamento do Estado para 2012, afirmava um parlamentar da oposição:

 

"Este Orçamento do Estado na área da saúde é uma de duas coisas. Ou é um Orçamento a sério, e é uma desgraça para o Serviço Nacional de Saúde; ou é um orçamento a fingir e não tem graça nenhuma. Se é um Orçamento para levar a sério, ele inevitavelmente tem um resultado que é a redução dos cuidados, a redução da assistência, a redução do acesso, da qualidade, o encerramento de serviços e hospitais. Se é um Orçamento a brincar, a fingir, um orçamento virtual, ele tem como resultado inevitável o aumento da dívida do Serviço Nacional de Saúde, que foi a receita utilizada por todos os seus antecessores. Ou seja, este Orçamento, tal como nos é apresentado, ou corta na assistência, ou aumenta a dívida do SNS".

 

Outrossim, na mesma ocasião, um parlamentar do principal partido da oposição não se coibia de proferir esta sentença:

 

"...consideramos injustificável que este Orçamento para 2012 possa colocar em causa o Serviço Nacional de Saúde como foi patente aqui neste debate (…). O PSD e o CDS não querem reformar o Serviço Nacional de Saúde, mas sim desmantelá-lo!"

 

Ficará, pois, ao critério de cada um aquilatar o despropósito e a inverdade de tais declarações, que mais não parecem do que tentativas de uma certa oposição empenhada em capitalizar o desconhecimento dos cidadãos menos informados e gerar alarmismo social.

 

Sem prejuízo do acima exposto, conseguir poupar mais 300 milhões de euros sem que isso signifique prejudicar o acesso dos portugueses ao Serviço Nacional de Saúde ou a qualidade do mesmo, é uma tarefa muito exigente que o país terá de enfrentar em 2014.

 

o divórcio

 

Foram divulgadas há dias as projeções económicas da OCDE. Se as últimas estimativas do Governo e da Comissão Europeia apontavam para uma recessão de -2,3% do PIB, para a OCDE a contração da economia nacional será ligeiramente superior, 4 décimas de ponto percentual.

 

Se em termos nacionais se deu relevo compreensível à estimativa agravada do comportamento da economia, desvalorizou-se o principal factor que a explica. De facto, a OCDE veio duplicar a estimativa de recessão para o conjunto de países do Euro. Ora, sabendo-se como se sabe que a nossa recuperação económica está muito dependente do crescimento das exportações, o agravar da situação dos nossos principais parceiros comerciais, destinatários das exportações portuguesas, ajuda a explicar o aumento das nuvens negras que sobre nós pairam. Isto, sem desvalorizar o efeito de uma estimativa de procura interna igualmente mais baixa.

 

Mas o agravamento acentuado da economia europeia merece um olhar mais atento.

 

A Itália teve  em Monti, até recentemente, o mais competente Primeiro-Ministro que poderia ter à frente de um Governo de perfil técnico. As políticas desenvolvidas seguiram o guião do receituário europeu de saída da crise, prescrito pela Alemanha e pelas economias do “Euro forte” (usando uma designação que Vítor Bento, com grande propriedade, usou recentemente) .

 

A resposta do eleitorado italiano foi a que foi: 10% dos votos para Monti, o fortalecimento de candidatos anti-sistema como Grillo, o ressurgir do populismo de Berlusconi, às portas da vitória com 1/3 dos votos.

 

À falta de resultados imediatos das medidas de austeridade implementadas, acentua-se um divórcio com o povo que desconfia da colheita a longo prazo de benesses dessa política e prefere castigar quem fala de reformas estruturais ou se atreve as implementa. Nada de muito surpreendente: é mais fácil acreditar em vitórias palpáveis ao virar da esquina do que numa recompensa do longo prazo que traz, no imediato, sofrimento e resultados contrários aos almejados.

 

Com a França a caminho da recessão e a Alemanha, mais cedo do que tarde, a poder experimentar o mesmo caminho cabe perguntar se não seria melhor para todos tentar uma saída conjunta e articulada deste labirinto...

 

Ou a fragmentação das políticas dá lugar a uma maior coordenação ou o processo de transferência de riqueza da Europa para a Ásia, em particular para a China, arrisca-se a ser mais doloroso do que o que, em condições normais, teria de ser. Com o termo “espiral recessiva” a poder aqui ser utilizado num novo contexto: os povos chumbam quem tenta implementar o atual “receituário”, colocam no poder quem não tem margem para, por si, fazer diferente, a classe política sai cada vez mais desacreditada.

 

Este é o caldo de cultura ideal para “Grillos” ou outros fenómenos ainda piores. O divórcio entre eleitos e eleitores acentua-se com cada vez melhores condições para o irromper de radicalismos ou nacionalismos exacerbados que já se pensava terem dado à Europa as lições que, ela própria, teria aprendido com a história.

 

E se o termo “austeridade”, naquilo que em si encerra, nada tem de vicioso, arrisca-se a ser derrotado pela conotação que as pessoas, os principais destinatários e agentes das políticas, lhe vão dando.

 

A Europa corre o risco sério de ao seguir de forma global mas fragmentada, ao mesmo tempo, o mesmo caminho, não permitir que os desequilíbrios de uns sejam corrigidos à custa do equilíbrio de todos. Se a reforma do Estado é, no caso português, um caminho adiado, mas hoje inadiável, e para ela as medidas de austeridade são também necessárias, convinha quem na Europa pudesse funcionar como escape. Ora, se até a Alemanha ainda recentemente veio anunciar cortes no seu próprio Orçamento para 2014...

 

Não é hoje concebível um alterar de política económica nacional sem uma mudança na política europeia ou na receita europeia de saída da crise.

 

Mais ainda quando Portugal é hoje, e assim será pelo menos até à saída da troika, se tudo decorrer normalmente em Junho de 2014, um país com a sua soberania económica condicionada.

 

Urge que as instâncias europeias não se preocupem apenas com os países da periferia onde as reformas estruturais e os cortes orçamentais são necessários – instando-os a não desistir e auscultando as linhas mestras da política orçamental destes - mas que olhem também, com a visão global que só a União poderá ter, para aqueles onde é possível (quiçá desejável) políticas mais expansionistas ou, pelo menos, de consolidação orçamental não tão forte.

 

Ao atrasar-se a fazer a sua parte, a teimosa passividade da liderança europeia, cada vez mais centralizada na Alemanha, arrisca-se a tornar medidas nacionais positivas como o recentemente anunciado crédito fiscal extraordinário em mero paliativo.

 

E o divórcio, esse, pode ser um processo penoso.

 

 

bom ano 2013

 

E ao 19º mês de troika em Portugal demos por nós a ter alguma dificuldade em desejar o habitual Próspero Ano Novo, preferindo o Ano Novo com muita Saúde, o Bom Ano Novo, ou, até, na versão mais optimista, o Feliz Ano Novo... Quase como se no nosso subconsciente colectivo, mais do que nunca, Portugal estivesse capacitado do quão duro é o caminho que ainda nos falta percorrer e começássemos a incorporar a ideia de que, no imediato, os "trabalhos" não são compatíveis com a prosperidade automática.


Mas se hoje já não deve haver lugar para mensagens desajustadas da realidade, que nos prometem, a cada dia, os amanhãs que cantam, também não há razão para cavarmos o buraco da depressão colectiva. Ter consciência das dificuldades é uma coisa. Deixarmo-nos bloquear por elas é outra. O medo paralisa e é necessário que todos, empresários, políticos, profissionais dos mais diversos sectores, transmitam uma mensagem de confiança, em si próprios e na comunidade.


A previsão de crescimento da economia da zona euro no próximo ano aponta para um valor abaixo dos 0,5% do PIB desta região. Já para os Estados Unidos prevê-se um crescimento de 2% e, para os países emergentes, qualquer coisa como 5,8%.


Estes dados configuram uma tendência inexorável, que já vem dos últimos anos e continuará. A globalização significa também isso: uns crescem mais, outros vêem a sua riqueza produzida diminuir em termos relativos. Para a China, ou, se quisermos ser mais latos, para a Ásia como um todo, crescerem e enriquecerem, Europa e Estados Unidos terão de crescer menos. A base de que uns e outros partem também não é a mesma, daí que, no final, o bem de uns não tem de significar o mal de todos.


Estarão os agentes das economias desenvolvidas conscientes dessa realidade? Estarão os cidadãos europeus, nomeadamente os portugueses conscientes dessa realidade? Para os Estados Unidos, a emergência da China como uma grande potência é hoje percebida como um misto de ameaça e oportunidade, mais da primeira que da segunda. E nós?


À luz desta realidade, o saber se podemos desejar um Próspero Ano Novo ou, para aludir à "discussão de réveillon", se as palavras do Presidente da República encerram em si uma declaração de guerra ao Governo, são questões de importância relativa. Saber se cada um de nós, e aqui não se incluem apenas os portugueses, mas os cidadãos europeus em geral, está preparado para combater a perda de influência (económica e política), é que é a grande questão da próxima década e décadas.


Com troika, agora, ou sem ela - esperemos que a breve trecho -, é crucial perspectivarmos o país que queremos a médio prazo. É hoje claro que, para uma economia pequena e tão aberta como a nossa, um modelo de crescimento baseado em investimento público não reprodutivo e em consumo, financiados por dívida externa, tão mais insustentável quanto menor for a capacidade de a pagarmos, não é caminho desejável. O caminho certo, esse demorará o seu tempo a construir: criar valor, comercializar bens ou serviços que os outros países queiram comprar e a preços competitivos exige muito.

 

O mesmo que já era exigido quando os primeiros “Medinas Carreira” deste País ousaram levantar a voz quanto a um certo consenso instalado e denunciaram a insustentabilidade de uma política. Escolas e universidades de nível internacional, tribunais que funcionem e em tempo útil, sistema fiscal mais competitivo, estruturas de distribuição eficientes, para tudo isso teremos de trabalhar. E temos, estou convicto, capacidades para o fazer.


A ideia de que temos que construir esperança não é incompatível com a noção clara de que 2013 não será um mar de rosas. Continuar a ser bem sucedidos na implementação das medidas do Programa de Assistência Financeira e, ao mesmo tempo, manter a coesão social é o grande desafio imediato. Concretizá-lo pode significar o dobrar do «cabo das tormentas» mas a passagem para a «boa esperança» não significa que poderemos voltar ao modelo de desenvolvimento que antes tínhamos. Isso já lá vai.


Mais do que falar num ano difícil é avisado reconhecer que o processo de ajustamento dos desequilíbrios económicos que nos levaram a pedir assistência financeira é mesmo isso: um processo. A reforma do Estado, que justifica por si uma próxima reflexão, desse processo terá de fazer parte. Acreditarmos nas nossas capacidades, enquanto indivíduos e enquanto comunidade, é o primeiro passo para tornarmos os próximos tempos, mais do que o próximo ano, o menos dolorosos possível.


Que o mais cedo possível sejamos, enquanto povo, resilientes o suficiente para podermos desejar a cada um, sem receios, um Próspero Ano Novo. A todos, um Ano 2013 com disponibilidade para ajudar quem precisa, vontade de vencer, garra para trabalhar e esperança num futuro melhor.

 

 

Nuno Reis

 

130113

-  uma versão deste artigo

foi publicada em

O Primeiro de Janeiro -

 

o tempo e os negociadores

  

A «vertigem» dos tempos que vivemos faz com que, por vezes, um ano possa parecer uma década e dezassete meses uma eternidade. Mas porque a amnésia pode ser combatida façamos aqui um pequeno exercício de memória...

 

A 6 de Abril de 2011 o Ministro das Finanças Teixeira dos Santos anunciou que acionaria um pedido de assistência financeira externa. O Estado ficaria sem dinheiro para fazer face a pagamentos de salários e pensões a partir de Junho seguinte, conforme reconheceu na altura. Foi então desencadeado um processo negocial conduzido pelo Governo socialista e por representantes de instâncias internacionais. A 17 de Maio era assinado um compromisso entre o Estado português, o FMI, a CE e o BCE.

 

Quando o Memorando de Condicionalidades de Política Económica e Financeira ou, por simplificação, memorando da troika estava a ser negociado vozes houve que calcularam as necessidades do «envelope» financeiro a entregar a Portugal em 100 mil milhões de euros e defenderam o mesmo período de tempo dado à Irlanda, 5 anos, para cumprimento dos objetivos de controlo das contas públicas em termos de défice nominal.

 

Tanto quanto é hoje público, o sempre diabolizado FMI terá defendido que dois anos e meio eram curtos para Portugal conseguir cumprir aquilo a que se comprometeu. Tanto quanto se sabe, foram os nossos “amigos” europeus do BCE e da Comissão Europeia que mais irredutíveis se mostraram no prazo a acordar com Portugal, nas verbas a disponibilizar e na própria taxa de juro dos empréstimos.

 

De lembrar ainda uma surreal conferência de imprensa de José Sócrates anunciando com ar triunfante as medidas que o Memorando não tinha para, no dia seguinte, Teixeira dos Santos explicar com detalhe o que efectivamente acabava de ser assinado.

 

Muitos dos que, logo a seguir às legislativas, começaram a defender “mais tempo e mais dinheiro” para Portugal foram apoiantes do anterior Governo e, nalguns casos, foram até os mesmos que negociaram sectorialmente com os técnicos da troika. Muitos dos socialistas que agora exigem que Portugal «bata o » em termos europeus e negoceie melhores condições foram os mesmos que acordaram os dois anos e meio e 78 mil milhões de euros para Portugal cumprir com 47 páginas de medidas. Espanta que tenham descoberto as fraquezas do Memorando logo a seguir aos resultados eleitorais de 5 de Junho de 2011!

 

Nem os Seguros, os Silva Pereiras, os Soares ou os Galambas desta vida reconhecem que foi já o actual Governo a solicitar em Junho deste ano flexibilização das metas do défice (leia-se mais tempo) nem reconhecem que se a troika aceitou, logo em Setembro, no final da 5ª avaliação periódica, acordar mais um ano para Portugal, tal se deve à credibilidade externa que o país, entretanto, granjeou. Credibilidade, diga-se, reconquistada à conta de muitos sacrifícios das famílias e empresas portuguesas e do cumprimento bem sucedido da maior parte das medidas do Memorando por parte deste Governo.

 

Se a taxa de juro média do empréstimo internacional passou de uns «punitivos» mais de cinco por cento para uma taxa média de 3,5 por cento tal não aconteceu por acaso mas por negociações internacionais nas quais o nosso Governo e os de outros países como Irlanda e Grécia também ajudaram.

 

Os recentes progressos rumo à União Bancária europeia a partir de 2014 contaram também com o forte empenho diplomático de países como Portugal e Espanha que se opuseram a um adiamento desse projecto.

Tudo isto são exemplos de uma postura diplomática portuguesa proactiva e que desmente críticas da oposição socialista.

 

Negociar internacionalmente com uma posição negocial tão fraca como aquela de que partimos não é um exercício fácil. Mais ainda num contexto de uma Europa com lideranças políticas fracas e individualistas.

 

Noutra perspectiva, as decisões que a Europa deve tomar ou já devia ter tomado não terão, no próximo ano, a melhor das condições para acontecer. E isso já não é questão de saber ou não «bater o pé».

 

Oxalá esteja enganado mas o facto de haver eleições nacionais na Alemanha em Outubro do próximo ano dificultará a aprovação no parlamento desse país de alterações substantivas que se traduzam num reforço suficiente (de preferência com maiores contribuições directas e não alavancadas) dos fundos de estabilização financeira da Europa nem de medidas de reforço da integração económica da Europa com uma maior coordenação orçamental. Nem, muito menos, haverá o beneplácito para que o BCE possa dar garantia ilimitada de comprar dívida pública dos países no mercado secundário. As "famosas" euro-obrigações, então, parecem longe neste calendário...

 

Estamos por isso obrigados a ganhar tempo. Tempo para que o pacote de incentivos fiscais e financeiros para apoio ao investimento seja aprovado pela troika. Tempo para que importantes vozes dentro do FMI consigam maior concordância por parte da Comissão Europeia e Banco Central Europeu. Tempo para que o nosso Memorando e o de outros países possam ser complementados com medidas substantivas para lá da estabilização das contas públicas e do sistema financeiro.

 

Quem nestas condições nos colocou deve no mínimo ser moderado nas críticas (17 meses não é assim tanto que não permita ter memória!) e assumir responsabilidades na busca de soluções. Que hoje, para serem definitivas, terão de vir, necessariamente, de uma maior solidariedade europeia. E quem pede maior solidariedade europeia, como Seguro, deve estar também disponível para uma maior solidariedade... dentro de portas.

  

Nuno Reis

 

121112

 
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Bernardino Soares - 6.3%
Heloisa Apolónia - 3.6%
Telmo Correia - 0.9%
João Semedo - 4.5%
Luís Montenegro - 17.9%
Nuno Magalhães - 3.6%
Carlos Zorrinho - 0.9%
António José Seguro - 15.2%
Carlos Abreu Amorim - 12.5%
Outros - 15.2%

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A votação para este inquérito já encerrou em: 30 Nov 2013 - 12:33